Ultimamente o Cinema tem se dedicado a tratar de exemplares casos reais de pessoas que não deram bolas para as suas deficiências físicas e romperam os limites da condição humana, do preconceito e da sexualidade. Contando a história real de um tetraplégico em busca da perda da virgindade, Ben Lewin faz de As Sessões uma emocionante abordagem sobre deficiência e sexualidade
Depois de O Escafandro e a Borboleta (2007), de Julian Schnabel, Intocáves (França, 2012), de Olivier Nakache e Eric Toledano, e Hasta La Vista! – venha como você é (Bélgica, 2012), de Geoffrey Enthoven, estreia com atraso na cidade o drama As Sessões, produção estadunidense dirigida por Ben Lewin, contando a história também real de Mark O’Brien (1949–1999), que contraiu poliemielite aos seis anos e, mesmo só conseguindo mexer em três músculos do corpo (um do pé direito, um no pescoço e outro no queixo) e tendo que as noites dormir em um pulmão de aço, se formou em literatura inglesa na Universidade de Berkeley e na Graduete School of Journalism.
Conhecido na comunidade se deslocar para as universidades de seu pequeno apartamento (mantido pelo pai e o seu próprio trabalho) em uma maca elétrica, O’Brien galgou o seu próprio espaço com uma pessoa dinâmica e batalhadora, superando os limites de sua capacidade física e servindo de exemplo para outras pessoas com deficiência quanto a necessidade de não se abater e levar uma existência normal.
Para isso, co-fundaria, com a namorada Susan Fernbach, uma pequena editora, a Lemonade Factory, especializada em editar livros de poesias e romances de pessoas com deficiência. Seus livros de auto referência, como How I Became a Human Being: a disabled man’s quest for independence (na tradução Como me Tornei um Ser Humano: à procura de um homem incapacitado por independência), e poesias (Breathing), foram editados por grandes editoras, como a Quartely Co-Evolution. Ele escrevia os seus textos utilizando-se, com a boca, de um pedaço de madeira com o qual batia nas teclas do computador, e, posteriormente, um processador de texto.
A superação o levou a escrever um de seus artigos mais celebrados, tratando da mitologia sobre as pessoas com deficiência. Escreveu: As duas mitologias sobre as pessoas com deficiência: 1. Não podemos fazer nada; e 2. Podemos fazer tudo, mas a verdade é que nós apenas seres humanos.
Mas, foi no jornalismo que Mark conseguiu notoriedade. E quem lhe deu a chance foi Sandy Close, editor da Pacific News Service, que o contratou como correspondente. O’Brien fez várias reportagens sobre as deficiências e como as pessoas afetadas lidavam com elas. Utilizou o veículo para lutar contra a burocracia, os preconceitos da sociedade e pelos direitos das pessoas com algum tipo de deficiência. Chegou até se postar como advogado em casos de outras pessoas junto à justiça.
Uma das pautas recebidas, sobre como os deficientes lidavam com a sexualidade, o levou a conversar com diversas pessoas e os depoimentos o encorajaram a tomar a decisão: virgem aos 38 anos, queria participar do banquete. Para isso, expressou o seu desejo em um artigo: Estou à procura de uma mulher inteligente, letrada de companheirismo e, talvez, para o jogo sexual, pois eu sou, como você vê, completamente paralisado, e, por isso, não haverá caminhadas na praia. No fundo, não alimentava esperança de sucesso, mas, para a sua surpresa, o artigo foi respondido por uma sex-surrogates (substitutas do sexo), Cheryl Cohen-Greene. O que acontece a partir daí está em As Sessões.
Dirigido por Ben Lewin, 66, polonês radicado desde 1979 em Hollywood e igualmente sobrevivente da pólio, As Sessões adapta o artigo On Seing a Sex Surrogate (Se Consultando com uma Substituta Sexual), no qual ele conta o processo de renovação da vida a partir das seis sessões de terapia sexual com Cheryl. Lewin, que é também o responsável pela adaptação do artigo, traz a história para o campo da humanidade.
Interessa a Lewin expressar a importância da sexualidade como elemento vital na existência. A jornada de O’Brien, narrada entre a realidade a ficção, é colocada nos dois campos de sua vida: a fé e a sexualidade. Como equilibrar, em um filme, os dois extremos que aparentemente são inaceitáveis? Católico praticante, O’Brien não queria confrontos com a Igreja e para isso consultou os padres de sua paróquia. De um deles, conseguiu o consentimento para praticar sexo via terapia e envolvendo pagamento financeiro.
O personagem do padre Brendan, o qual se constitui em confessor de O’Brien, é criação de Lewin. É através dele que o cineasta coloca o sexo, também, no nível da espiritualidade. É aí As Sessões promove as reflexões a partir das exigências da religião de sexo apenas no casamento. Há implicações humanas, sociais e da própria religião, todas no campo filosófico.
Em uma narrativa pontuada por personagens que compõem um painel da existência humana em suas mais diversas condições, As Sessões celebra a renovação da vida a partir do afeto, do carinho e do companheirismo. Aceitam-se de pronto a afirmação de alguém de que ninguém é uma ilha. O sexo é a cereja no bolo, aquilo que forma o sabor diferente. Ou pode ser um banquete.
Em entrevista, Cheryl Cohen-Greene (que é casada e tem filhos), disse que se assuntou quando viu, pela primeira vez, aquele corpo muito frágil a medida na qual tirava a camisa e seus braços doíam quando ela os tocava. Até então, ele só tinha sido tocado por médicos, atendentes e enfermeiras, além de sua ajudante cotidiana. Ele me disse que sentiu como se estivesse do lado de fora olhando para dentro de um banquete, mas que ele sabia que nunca seria capaz de provar aqueles alimentos, disse Greene, com emoção. Assim que o conheci, jurei que ele teria a chance de provar do banquete, revelou.
O mais admirável em As Sessõs, é a entrega de seus atores, especialmente de Helen Hunt, brilhante e que deveria ter levado o Oscar de atriz coadjuvante (injustamente deu Annie Hathaway por Os Miseráveis). Ela passa grande parte do filme despida por inteiro. E John Hawkes, que vive O’Brien, e William H. Macy, interpreta do padre Brendan, estão igualmente notáveis.
Com extrema sensibilidade e uma delicadeza capaz de emocionar, Ben Lewin faz de As Sessões uma grande revelação sobre deficiência e sexualidade. E afirma: o banquete é para todos.
Ficha técnica
As Sessões
(The Sessions
EUA, 2011
Diretor: Ben Lewin
Elenco: Helen Hunt (Cheryl Cohen-Greene), John Hawkes (Mark O’Brien), William H. Macy (Padre Brandon), Moon Bloodgood (Vera), Annika Marks (Amanda), Adam Arkin (Josh) e Ming Lo (Clerk)
Fox
110 minutos
14 anos
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